terça-feira, janeiro 25, 2011

Bairro da Luz.- XFC








<1>


declarou-se destripador
de estrelas
por covarde
por não ousar
destripar soidades

porém
as suas tripas correm
noite abaixo
fugendo pontes
sem reflexos
jurando
anceiando
tanta tinta
que acariciava



<2>


quero ver-te
enroupada na baranda
e o porto
às tuas costas

gosto de ver-te sorrir
quando os teus óculos de sol fazem piadas
e a brisa retoma o tempo
percorrendo o teu cabelo 

nem o inverno
é inverno
quando o mar me sussurras
ali
na baranda do porto
pensando silhuetas



<3>


bêbedo
das tuas coxas
mais uma noite
primavera
ou uma estação por inventar
nos vértices
de tantas bocas



<4>



és linda
muito linda

desculpa
não fomos apresentados

dizia...
és linda
muito linda
embora nunca te conheça


<5>


apenas quando adormeces
existe em ti
um recanto
o bairro das luzes
onde mora
o indezível

e fazes confluir
o Tejo com Praga
o Moldava com Lisboa

apenas quando adormeces
existe em ti
o bairro das luzes
boca de humidades
mapa de carícias
e praias
lentamente anceiadas




<6>

escreve-me

queres que che escreva
absurda e vaidosa
quando és apenas
uma nódoa
no meu guardanapo
sem forma 
nem rima

escreve-me, insistes

deixo a conta sem pagar
vou embora



<7>

ignorava
que os esqueletos
dançassem

pensei que
eram vozes frustradas
caramelos cuspidos
ou ligações para o absurdo

até que te conheci
então percebi
ossos envejosos
até da pelelha resseca dum tambor

como pode a morte
tentar espelhar-se
nos lábios do mar
e acreditar
que ainda nalgures
lhe mora beleza

não é por caso
que te chames dores
enquanto inerme aguardas
que floreçam as falanges
do teu mais anónimo
inverno
inverno


<8>


à noite
na ponta das dedas
tu
sempre menina

fora chove
miudinho
para não acordares

dorme
miudinha

© Xavier Frías Conde 2011
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