domingo, outubro 11, 2020

FILHO DE MEIGAS ~ HIJO DE MEIGAS

 


sou filho de mil bruxas
mil meigas que tentastes queimar
   ou se calhar queimastes
mas não

sou filho da sua raiva
sou herdeiro da sua cegueira
sou mar dos seus rumos

sou filho daquelas mil bruxas
que fingiram calar
que hoje voltaram
sem se embrulhar porque gostam de voar nuas​

sou filho de uma mãe
que me ensinou a vos maldizer cantando
portanto
canto-vos enquanto vos maldigo

& & &

soy hijo de mil brujas
mil meigas que intentasteis quemar
   o que quizá quemasteis
pero no

soy hijo de su rabia
soy heredero de su ceguera
soy mar de sus rumbos

soy hijo de aquellas mil brujas
que fingieron callarse
que hoy han vuelto
sin envolverse porque les gusta volar desnudas​

soy hijo de una madre
que me enseñó a maldeciros cantando
por eso
os canto mientras os maldigo

© Frantz Ferentz, 2020

PREAMAR ~ PLEAMAR

 


f​​ascínio da preamar no teu cabelo
é quando fecho os olhos
e mergulho no tempo
que cheira a ti

felizmente 
ainda não amanhece

& & &

fascinación de pleamar en tu cabello
es cuando cierro los ojos
y me sumerjo en el tiempo
que huele a vos

por suerte
aún no amanece

© Frantz Ferentz, 2020

quinta-feira, outubro 08, 2020

VIDA

 



não nos fica tanta vida
a vida
      como bem sabes
não é uma ciência exata
é mais bem inexata
caprichosa
e até mordaz

embebedemo-nos de vida
até que escorregue pelos lábios
e adormeçamos

inventemos novos hedonismos
efémeros
sem ousar batizá-los

e vivamos
vivamos
por cima das nossas possibilidades

& & &

no nos queda tanta vida
la vida
     como bien sabes
no es una ciencia exacta
es más bien caprichosa
y hasta mordaz

emborrachémonos de vida
hasta que se nos escurra polos labios
y nos adormenternos

inventemos nuevos hedonismos
efímeros
sin osar bautizarlos

y vivamos
vivamos
por encima de nuestras posibilidades

© Frantz Ferentz, 2020

QUANTO PRESTA ~ CUÁNTO ME GUSTA

 


sou 
esse maldito bem-nascido
que vos interpela
da ponta da língua

nem imaginam
como presta saber
que vos lixa
que eu viva

&  &  &

soy
ese maldito bien nacido
que os interpela
desde la punta de la lengua

ni os imagináis
cómo me gusta saber
cuánto os jode
que viva

© Frantz Ferentz, 2020

terça-feira, outubro 06, 2020

QUANTO NOME ~ CUÁNTO NOMBRE

 



quantas noites

são os nossos corpos

quantas milhas
têm os nossos limites nunca marcados

quanto de mim
não és tu

quantas vidas precisamos
para fingir que vivemos

quantas mortes
limitam a tua sombra

quanto nada
nos fica por engolir

quanto tempo ainda olharei
para o vazio
enquanto mexo silentes os meus lábios
a pretender que pronuncio teu nome
    o teu nome
apenas um café frio

&  &  &

cuántas noches
son nuestros cuerpos

cuántas millas
tienen nuestros límites nunca fijados

cuánto de mí
no sois vos

cuántas vidas necesitamos
para fingir que vivimos

cuántas muertes
bordean tu sombra

cuánta nada
nos queda por tragar

cuánto tiempo aún miraré
al vacío
mientras muevo en silencio mis labios
como si pronunciase tu nombre   
    tu nombre
apenas un café frío

© Frantz Ferentz, 2020

CANIBAIS ~ CANÍBALES



é tempo de canibais
beira a beira
preamar

nalguma altura 
esqueceste flutuar
    no contorno da tua boca
não há mais luz

infringes a desmemória
enquanto ainda lembro
quando eras corpo
      aquele teu sorriso
       a tua forma de silenciar 
já mais nada
e tu nada
mas sempre abundam
ao teu redor e nas sombras
os mesmos canibais

&&&

es tiempo de caníbales
orilla a orilla
pleamar

en algún momento 
se te olvidó flotar
   en el contorno de tu boca
ya no hay luz

infringes la desmemoria
mientras aún recuerdo
cuando eras cuerpo
      aquella sonrisa tuya
      tu forma de acallar 
ya más nada
y vos nada
mas siempre abundan
a tu alrededor y en las sombras
los mismos caníbales

© Frantz Ferentz, 2020

QUERO UMA LÍNGUA ~ QUIERO UNA LENGUA



quero uma língua

não se importa se
de trapo
de papel
digital
ou usada

quero uma língua
que me dispa
sem pedir licença
e me permita soletrar
pelves no escuro

quero uma língua
fiel
anónima
e improvisada

quero uma língua
para mim
que apenas
eu
saiba falar

quero a tua língua

&&&

quiero una lengua
no importa si
de trapo
de papel
digital
usada

quiero una lengua
que me desnude 
sin pedir permiso
y me permita deletrear
pelvis en lo oscuro

quiero una lengua
fiel
anónima
e improvisada

quiero una lengua
para mí
que solo
yo
sepa hablar

quiero tu lengua

© Frantz Ferentz, 2020

terça-feira, setembro 29, 2020

FALAI ~ HABLAD




falai
falai-me
percorrei
percorrei a minha embalagem
e destinai
um par de existências
a contar-me chuvas

e falai
falai-me
em pretérito hipotético
de evitativo


hablad
habladme
recorred
recorred mi envoltorio
y destinad
un par de existencias
a contarme lluvias

y hablad
habladme
en pretérito hipotético
de evitativo

© Frantz Ferentz, 2020

quinta-feira, setembro 03, 2020

VIBRAÇÕES ~ VIBRACIONES

 A short, shaky history of curing with vibrations


decidi retomar o alento
voltar o olhar para dentro
e pronuniar talvez
dois ou três nomes ferrugentos

talvez deva redesenhar as beiras
da minha sombra
calar por decoro
e desconfessar--te
que alguma vez vibrei
     corrijo: que alguma vez te vibrei



he decidido retomar el aliento
volver la vista adentro
y pronunciar quizá
dos o tres nombres oxidados

acaso deba redibujar los bordes
de mi sombra
callar por decoro
y desconfesarte
que alguna vez he vibrado
       corrijo: que alguna vez te he vibrado



© Frantz Ferentz, 2020

segunda-feira, agosto 31, 2020

SÍLABAS IMPROVISADAS (PT/ES)

 


Ao meu pai

nem esperaste mais
pela hora da luz
pois a luz já era
faz tempo
mais do que uma morada de alentos

tu
por enquanto
já tinhas decidido
soprar-me um arco-da-velha
e falar
nessa língua que nunca falaras
e subir
até onde nunca subiras

lembranças da infância
que chegam ao final do princípio
uma mão -a tua-
que nunca cessou
um alento
que sempre flutua
por atrás das pálpebras
nós os dois cúmplices
que resolvemos partilhar
entre as sílabas improvisadas
de filho e pai

e só te digo
até breve
pai


ni esperaste más
la hora de la luz
pues la luz ya era
desde hace tiempo 
más que una morada de alientos

mientras
ya habías decidido
soplarme un arcoíris
y hablar
en esa lengua que nunca hablaste
y subir
donde nunca subiste

recuerdos de infancia
que llegan al final del principio
   una mano -la tuya-
que nunca cesó
   un aliento
que siempre flota 
por detrás de los párpados 
   nosotros dos cómplices
que decidimos compartir
entre las sílabas improvisadas 
de hijo y padre

y solo te digo
hasta pronto
    papá

© Frantz Ferentz 27 de agosto de 2020

quarta-feira, abril 08, 2020

MORIR PARA ENTENDER

6 Photographers squad shooting against the Tagus River mar… | Flickr

cualquier día
te descubriras asomada a la nada
sabrás que dejaste resbalar
trescientas vidas
una tras otra
una tras otra

serás triste baranda
por encima de un Tajo moribundo
romántico por una cuarentena
que dura toda una vida
es decir
    una exhalación

siempre recurres a los ríos
a sus orillas descalzas
para desearte primavera

separa los brazos
cierra los ojos
y recita
una plegaria que te suplante
la piel

morir para entender

© Frantz Ferentz, 2020

domingo, abril 05, 2020

FACE DA TERRA | FAZ DE LA TIERRA

06 Jessika Kenney & Eyvind Kang - The Face of the Earth [Ideologic ...

ouço por fim
os teus passos discretos
além do vidro
a ecoarem na rua

será que choves
será que calas
me choves
e nos calas?

só tu
minha face da terra


oigo por fin
tus pasos discretos
más allá del cristal
resonando en la calle

será que llueves
será que callas
me llueves
y nos callas?

solo vos
mi faz de la tierra

© Frantz Ferentz, 2020

segunda-feira, janeiro 13, 2020

MÃE DE NASCIMENTO | MADRE DE NACIMIENTO

Resultat d'imatges de sleeping nature

hoje toca
proferir novamente as tuas entranhas, mãe

sou a hemeroteca que é sempre publicada quando já a luz
adormece no teu colo

hoje é esse dia, mãe
mas tu não dás por isso

***

hoy toca
pronunciar de nuevo tus entrañas, madre

soy la hemeroteca que siempre se publica cuando la luz
se duerme en tu regazo

hoy es ese día, madre
mas vos ni lo notas

© Frantz Ferentz, 2020